
Quão belo se apresenta o viver sem grandes inquietudes ou desassossegos, sem a dor dos sentidos.
'Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos.)
Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.
Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassosegos grandes.
Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar. ' (Fernando Pessoa, Ricardo Reis)
Maravilhoso é o despertar da Natureza que com os primeiros raios de sol parece, a cada dia, renascer. O encanto torna-se deliciosamente maior.
Sinto que a minha alma se está a preencher de agradáveis sensações. Dou outro sentido ao sentir.
A paz nasce em mim, trazida pelo rio que corre tão natural e sossegadamente, como se conhecesse de cor o seu caminho.
Sons, cores, aromas, fragrâncias... Dou aso ao meu imaginário e permito o despertar de todos os sentidos que pousam, deslizam, tocam e encantam.
Observo duas borboletas que se passeiam entre as pétalas coloridas de flores e florzinhas, selvagens. Sorrio, admirando a paisagem.
A natureza possui um esplendor, um segredo que designo de perfeição.
Natureza, essência selvaticamente pura
Os rios correm, sempre no mesmo sentido e não se cansam,
Com a manhã despertam as cores, os sons
Com a noite pairam os silêncios de todos os adormecidos
Ficam os olhares dilacerantes do amigos rapinantes
E a intensidade com que os 'canis lupus' uivam ao som da luz da lua.
As tardes são preenchidas pelo brilhar do sol quente
E pelas sombras das árvores tão grandes quanto antigas.
Natureza, mãe de todas as mães
A fecundidade, a multiplicidade plena
Equilibrio inesgotável de uma ordem natural
Ferocidade nada vulgar
Ela canta, encanta,
Acolhe, consola,
Deslumbra, protege.
É feroz!
Magoa, mata e aprisiona.
Enquanto a vida passa e não passa, vivamos e sintamos o que de melhor existe, quer seja à nossa volta, quer seja apenas o que existe dentro de nós.